quarta-feira, janeiro 02, 2008

CIRCO COM JAZZ DE FUNDO - A HOMENAGEM QUE FALTAVA AOS DIXIEGANG






É surpreendente para pessoas com menor conhecimento do "Jazz dos primórdios", como ele e familiar e simples: a melodia é cantável, o ritmo convida o corpo á dança, a harmonia é frequente, previsível e o ambiente da música sugere leveza e despreocupação. Numa segunda análise, no entanto, esta musica - em particular quando tocada pelos seus interpretes maiores - Louis Armstrong, Bix Beiderbecke, King Oliver, Jelly Roll Morton, Kid Ory, etc. - revela-se extraordinariamente rica e subtil e mesmo complexa nos arranjos, nas variações de ritmo, nas progressões harmónicas e "last but not the least" na inspirada improvisação. Só assim se compreende que a música tocada por estes músicos desde o princípio do século, tenha lançado bases para uma nova linguagem musical com temas e sonoridade que, quase 90 anos, nos mobilizam e emocionam.
Vários Países Europeus acompanharam os Estados Unidos na apreciação deste Jazz clássico também chamado "Dixieland". No Reino Unido, França, Alemanha e Holanda por exemplo, o Jazz clássico é tocado por inúmeras bandas e recriado em frequentes e informais "Jam sessions".
Sete "fanáticos" desta música fundaram em 1991 o Dixie Gang. Este grupo editou o seu primeiro CD em 1999 - Jazz me Blues -, desde que foi criado já realizou cerca de setecentos concertos em festivais de Jazz, na televisão, em clubes, discotecas e nas mais variadas manifestações em que requer o enlevo da musica.

Fundados há década e meia, os Dixiegang, dos quais Paulo Gaspar é clarinetista, tocam em todo o tipo de eventos, de festivais a festas de casamento e até a funerais, como aconteceu no enterro de Luís Villas-Boas, fundador do Hot Clube de Portugal.
O Dixie Gang é composto por João Viana (cornetim), Claus Nymark (trombone), Paulo Gaspar (clarinete), Jacinto Santos (tuba), David Rodrigues (piano), Silas Oliveira (banjo) e Rui Alves (bateria).

0 repertório do Dixie Gang é constituído essencialmente por jazz dos anos 10 e 20 do século XX.

Com já se disse o agrupamento iniciou a sua actividade regular em 1991, tendo apresentado, desde então, um grande número de espectáculos ao vivo, destacando-se as igualmente participações em vários festivais de jazz nacionais e estrangeiros.

Preparam-se agora para gravar um novo cd ao vivo do Festival de Jazz de Valado dos Frades. O seu último CD, "Jazz me Blues", editado em 1998, encontra-se esgotado.

Originária de New Orleans, a cidade mártir do Louisiana, a sua música como que escorre pelas paredes, torrencial, num delírio de ‘dixieland’ e ‘old jazz’. Depois de ‘Jazz Me Blues’, a banda acaba de gravar o segundo disco, ‘Pimenta da Terra’, uma nova viagem até aos pântanos do sul dos Estados Unidos da primeira metade do século passado.

Formada por sete elementos (clarinete, cornentim/voz, souzafone, trombone, piano, banjo e bateria), a banda representou Portugal no Festival Internacional de Dixieland de Tarragona, depois de participações anteriores na Eslováquia, em Macau ou em Espanha. “Divertimo-nos muito. É que gostamos mesmo de estar em palco”, diz Paulo Gaspar. Ver os Dixiegang é como assistir a um grupo de homens de barba rija a brincar ao circo – mas com música de primeira qualidade.

ouvir cd em http://www.dixiegang.com/

As palavras de Paulo Gaspar em entrevista ao Correio da Manhã EM 23-6-2006:

Primeiro, foi o medo.
“Eu era o gordo e o Manel quase todos os dias me dava porrada. Vinha de uma família de 14 irmãos e hoje só tem um terço dos dentes – todos podres”, conta. Depois, foi a inércia. “De forma que fiz parte do gang por medo de não fazer parte. Podia sofrer represálias se não fizesse. O líder era o Tó Pardal, que entretanto teve um problema com um cigano que lhe deu um tiro e lhe arrancou parte da cara. No início chateávamos as velhotas, roubávamos laranjas e atirávamo-nos do segundo andar de prédios em construção. Depois apareceram as drogas. Mas eu já não entrei. Já então tinha percebido que a música era a minha tábua de salvação.”

Foi assim a adolescência de Paulo Gaspar: turbulenta, confusa, repleta de histórias relacionadas com drogas, tiros e pessoas com alcunhas inspiradas na vida selvagem. Até aos 17 anos o jovem ribatejano dividia o tempo entre a escola secundária e a agricultura, trabalhando nomeadamente na apanha do tomate ou nas vindimas, da poda à empa, da sulfatagem à colheita. Aos 17, concluído o liceu, foi para a construção civil como servente de pedreiro. Mas já antes encontrara o seu caminho. Membro da banda filarmónica local desde os oito anos, como clarinetista, é hoje, aos 36, o mais reconhecido músico de clarinete do jazz português. Acaba de concluir o mestrado e trabalha já no doutoramento em Artes Musicais. Solista da Banda da Armada, é professor na Escola de Jazz Luís Villas-Boas, membro da Big Band do Hot Clube de Portugal e elemento, entre outros projectos como ‘freelancer’, dos Dixiegang, o principal conjunto português de ‘old jazz’.

“Até aos 17 anos só podia ir ao ensaio da banda depois de acabar o trabalho na agricultura. Os ensaios eram aos sábados à tarde e, apesar de ser asmático, o meu irmão trabalhava até ao limite das forças para me ajudar, pois sabia que a música era importante para mim”, recorda. Filho de um fiel de armazém e de uma doméstica, Paulo Gaspar viveu primeiro no Bairro da Torre, feito essencialmente de casas de lata – e entretanto demolido, com toda a população realojada em habitação social – e depois num pequeno apartamento no centro da cidade da Azambuja. A maior parte do tempo, porém, passava-o na quinta do avô, em terra de lezíria, vinho e toiros. “Acabava o dia, pegava na bicicleta e vinha da propriedade até ao centro da vila. Chegava todo cheio de lama e os miúdos da escola gozavam comigo. Mas então eu pegava no clarinete, punha-me a tocar Beatles ‘in concert’ e era a realização total ”

A música apareceu sobretudo por influência indirecta do avô, entretanto falecido, cujo passado como músico amador o levara sempre a desejar descendência artística. E, em 1978, quando o Centro Cultural Azambujense abriu a banda filarmónica e a respectiva escola, o pai de Paulo Gaspar inscreveu--o de imediato. Não foi um começo fácil. Último clarinete da última fila dos instrumentos de sopro, o jovem músico detestava o solfejo e quis por diversas vezes desistir. “Ainda por cima o Miranda, meu professor, que era Ranger, batia- -me. Só não desisti porque o meu pai não deixou”, conta. O momento da afinação dos instrumentos – que no clarinete se faz através do encaixe das três peças, concluindo o encaixe ou deixando-o incompleto – era outro pavor: Paulo Gaspar deixava guinchar o instrumento e, durante alguns minutos, toda a banda o gozava. “Era o momento deles. E eu só pensava: ‘Algum dia vocês vão ter de haver-se todos comigo Algum dia eu hei-de dominar isto!”

Até que, a certa altura, o maestro João Teófilo olhou para a criança ao fundo da fila dos clarinetes e pediu-lhe para fazer a cadência principal de ‘As Uvas do Douro’. Tudo mudou. “Passei de último clarinete a solista. E foi isso que espoletou a coisa toda. Basicamente a música levou-me de um lugar de chacota para um lugar de destaque. E, a partir daí, nunca mais parei”, sublinha Paulo Gaspar. Mesmo a agricultura, que ainda viria a praticar durante alguns anos, ou a construção civil, a que se dedicaria após a escola secundária, confuso sobre que carreira seguir, acabaram assim por ser apenas interregnos num percurso essencialmente coerente. “Houve momentos em que não sabia para onde ia. Mas sabia que queria continuar com a música. Como entretanto comecei a namorar com uma estudante do segundo ano de Farmácia, achei que não podia ser aquilo de uma farmacêutica namorar com um servente de pedreiro – e decidi fazer mais a sério pela vida. Mas não me esqueço dos tempos mais duros. Foram essenciais na minha formação.”

Paulo Gaspar estreou-se ao clarinete em Março de 1979, na procissão da Senhora dos Passos, na Azambuja. Feito o trajecto como membro da banda filarmónica, inscreveu-se no Conservatório aos 19 anos e aos 21 na Escola Superior de Música. Bacharel em Clarinete desde 1994, concluiu a licenciatura em 1999 e o mestrado já este ano, com uma tese em torno da relação entre o clarinete e o jazz. O doutoramento, na Universidade de Évora, centra-se na obra de Benny Goodman, o grande clarinetista do ‘swing’ e das ‘big bands’ dos anos 30 e 40.

No currículo de Gaspar contam-se presenças nos mais variados festivais nacionais e internacionais, participações em todo o tipo de bandas de jazz e orquestras de música de câmaras e colaborações com diversos autores de música contemporânea, de Jorge Palma a Sérgio Godinho, de José Mário Branco a Vitorino e João Gil. “De cada vez que conseguia passar para a dimensão seguinte, era um sonho. Ao princípio o próprio Conservatório ou a Banda da Armada pareciam absolutamente inacessíveis para mim”, diz.

Residente durante vários anos em Setúbal, Paulo Gaspar decidiu entretanto voltar à velha Azambuja, de onde emocionalmente nunca chegou a sair. Sabe que santos da casa não fazem milagres – e que por isso muitos ainda o vêem como o adolescente que tocava na banda filarmónica. Mas está feliz por reencontrar a lezíria, embora entretanto a industrialização se tenha intensificado e de Lisboa, cidade que se mantém à mesma distância de 50 quilómetros de sempre, cheguem agora comboios a cada trinta minutos, quando antigamente não havia mais de três carreiras por dia.

“Cada década que passa, o jazz em Portugal duplica a sua dimensão.
Basta ver o que se passa no género de música que os Dixiegang fazem. Começámos há 15 anos e, na altura, éramos a única banda do género. Depois apareceu outra, os Estardalhaço da Geringonça. Hoje, há mais de uma dezena de grupos”, diz. “Para além disso, somos o país da Europa com mais festivais ‘per capita’. Só falta o reconhecimento a nível do ensino. Mas mesmo isso começa a mudar.”

Paulo Gaspar dividia o seu tempo na adolescência entre a escola e a agricultura. Aos 17 anos trabalhava na construção civil, como servente de pedreiro. Hoje é o mais reconhecido – e provavelmente o melhor – clarinetista português de jazz. Nasceu num bairro de lata, fez parte de um gang e muitos dos amigos de infância sucumbiram às drogas. Alguns foram presos, outros morreram de overdose.
Mas ele encontrou o seu caminho a partir de uma banda filarmónica e agora trabalha no doutoramento em Artes Musicais.


MEMBROS:

João Viana
Médico de profissão, trata o CORNETIM com o mesmo cuidado com que trata os seus doentes
Claus Nymark
Músico profissional, prova-nos que da Dinamarca não vem só boa cerveja: vem também excelentes TROMBONES
Paulo Gaspar
Licenciado em CLARINETE pela Escola Superior de Musica de Lisboa, toca Mozart ao almoço e Albert Nicholas ao jantar...
Jacinto Santos Músico profissional e produtor, segura os graves da banda com o seu famosíssimo SOUSAFONE.
David Rodrigues
Professor Universitário e exerce Psicomotricidade aplicada no PIANO.
Silas Oliveira Jornalista de profissão, foca num BANJO digno de um museu, Blues das melhores colheitas.
Rui Alves
Musico profissional, e na BATERIA e onde calha que marca os ritmos fortes e as subtilezas que enquadram este Jazz.

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