sexta-feira, setembro 21, 2007
O QUE É FEITO DE LULA PENA ?
Vi a actuação mágica sua, ocorrida em 2002, no Grande Auditório da Culturgest (Lisboa), aquando do Festival Europa é só conhecia o CD Phados mais a musica do Rodrigo Leão "Passion".
Lula Apresentava então o seu novo álbum Profissão de Fée (trocadilho linguístico com a palavra francesa Fée, que significa fada).
O Cd nunca viu a luz do dia o que é um autentico crime lesa cultura, pois trata-se de uma obra impar no panorama musical Português.
Pelo menos o ano passado ainda não tinha saído.
O disco profissão de fée, que é um corte radical com "Phados", Lula Pena no qual contou com dois músicos de cada canto do globo: o holandês Jan de Haas e o iraquiano de origem Osama Abdulrasol.
Lula Pena deixou o fado e com o auxílio de um khanou (instrumento asiático de 70 cordas), de bongos ou do vibrafone, desfocava horizontes em direcção aos ventos quentes do deserto
Mas a dianteira pertencia à voz.
De repente, do meio da plateia, um homem perde a vergonha e diz muito calmamente, em alto e bom som: «não saímos daqui enquanto não cantar o "Pasión"». Lula Pena sorri e responde: «não tenho ao meu lado o Rodrigo Leão». Mas a cantora, destemida, lança-se a um solo vocal do tema e faz a vontade ao espectador. Foi um momento arrasador.
Depois desta actuação brilhante, presenciada pelo então ministro Bagão Felix Lula Pena desaparece do mapa e o disco não é editado.
Em 2005 participa no FMM de Sines, com concerto marcado para o Centro de Artes da cidade, no dia 24 de Julho.
Em Novembro de 2003 havia tocado ao vivo, em Almada.
Volta em 2006 para um concerto na Galeria Zé dos Bois,assim descrito:
caminho é muito longo e a vida muito curta, Lula Pena aceita a tragédia e quer protagonizá-la... Hoje lusófona, amanhã árabe, depois africana... Este espectáculo persiste na descoberta duma identidade universal, através dos sons da música portuguesa, africana, árabe... A fusão musical de raízes comuns e distintas, próximas e longínquas. Os desafios, os riscos e as metas, o culminar duma crença – a Terra mãe de todas as músicas – isto é Lula Pena
Há já demasiado tempo que não ouvíamos o cantar de Lula Pena. Na pele, guardamos [Phados], disco que operou por via do Fado, a transmutação da canção popular e tradicional, numa coisa única, a que só podemos chamar a música de Lula Pena. Recapitulando: “Já entrou toda a gente? O meu coração está aos pulos”. (silêncio) “O que custa é o início... dizem...” Mais um compasso de espera e finalmente, a voz quente e funda de Lula Pena enche o já lotado Aquário da Zé dos Bois.
O mote é dado com “Lago”, um dos muitos Fados popularizados pela omnipresente Amália. “Desci por não ter mais forças Às águas verdes, sem fim. Mesmo que voltem as forças, não me separo de mim”. Canta, levemente rouca, vibrando. Termina e lança-se, sem parar, a “Dedo De Deus Tocou Em Mim” do pernambucano Otto. Pena, canta agora com sotaque do Brasil. De olhos sempre fechados, guitarra funcional e competente, não permite interrupções e segue com “Lágrima”, outro dos hinos da diva do Fado. A meio da música arranca em ritmo sincopado e sussurra estrofes em inglês. Vinte minutos volvidos e Lula Pena está, ainda, tensa. Mas com “Júlia Florista”, Fado tradicional cantado com sotaque brasileiro, recebe a primeira ovação. As palmas sentidas, há muito guardadas, preparam o primeiro grande momento da noite. Do primeiro disco, recupera “Senhora do Almortão”, um tradicional minhoto. A voz solta-se, finalmente. Assobia, depois arqueja ritmicamente, próxima de uma linguagem primitiva, criando uma dinâmica plena de emotividade.
Sentimos o calor e o exotismo de outros Continentes. Pensamos na origem do Fado e acreditamos na sua mestiçagem. Percutindo a guitarra, prolonga os finais das canções e envolve-nos. Gostamos dela assim. “Rosa Enjeitada” emociona-nos. A meio, interrompe com “Do You Really Want To Hurt Me” dos Culture Club, regressando depois ao Fado. As mudanças de idioma e de sotaque cortam o elo emocional. Não nos esquecemos nunca que Lula Pena canta as canções de outros. Sem parar, mais um Fado, “Fria Claridade”. Uma guitarra marialva, próxima dos “nossos” Dead Combo dá o mote. Depois, percute a guitarra, qual bombo de uma parada de bombeiros e, de olhos fechados, abanando a cabeça, chora: "Acordei, a claridade fez-se maior e mais fria. Grande, grande era a cidade, e ninguém me conhecia". Momento da noite.
“Estou a morrer de calor... vou tentar acabar antes que derretamos todos”. Entre harmónios e acordes, atira “Eu Quero A Rosa Rosa”. Do português de Portugal, passa para o do Brasil e depois para o inglês. Regressa a Vinicius com um excerto de “Chega de Saudade”. Arquejando antecipa lentamente o final. Acende um cigarro.
A MUSICA DE LULA PENA
Lula Pena ouve sons e quer expressá-los através do seu corpo, tendo como instrumento uma voz; como som do rio a tremer, da terra a respirar, do céu a crescer. Uma voz, um apelo da memória de alguém que ouve com os sentidos todos e quer revelar, naturalmente, as conversas secretas com o seu próprio coração; esse músculo vermelho e esponjoso, que sobrevive de irrigações constantes e vive de ritmos ora mais lentos ora mais rápidos.
Ela sente a idade da terra e o peso de tão grande dimensão, quer cantar as suas memórias mais antigas, quer cantar as raízes do mundo com a fatalidade de quem sabe que a vida é curta para tão longa viagem. Dar a voz ao canto da fatalidade. Da lonjura. Do destino. Da tragédia.
Phados – o nome escolhido para o seu primeiro disco, editado em 1998 na Bélgica. Poucos ficaram indiferentes. Alguns surpreendidos. Muitos encantados de espanto. Todos os que passaram por este primeiro contacto ficaram, mais ou menos ansiosos, há espera dum futuro anunciado, porém incerto, por esta voz funda e afundada nas profundezas dos mistérios do corpo, ciente do pudor da Alma.
Musicalmente, pretende mexer na raiz do fado inventado por Amália, na raiz da música inventada por Caetano Veloso e Chico Buarque, na raiz da morna de Cesária Évora, nas raízes Populares de autores anónimo.
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